A ideia de se reunir pra fazer Sarau já é antiga na Casa. Os anos passam, pessoas entram e saem, algumas voltam, outras não. O Sarau continua sendo um momento especial para todos, de afeto e encontro! A cada momento este espaço apresenta novas possibilidades, formatos, ideias. Este ano nossos encontros foram em abril e maio, e já quisemos objetivar um pouco. Tentar expressar em palavras o afeto. Nada fácil!
Daí em abril... nos propomos a pensar coletivamente sobre como está
nossa comunidade atualmente. O que mudou? O que ficou? O que não vimos? Estávamos
em vários neste dia, tínhamos fotos dos últimos vinte anos da comunidade.
Tínhamos pão e vinho. Tínhamos disponibilidade entre nós.
Na roda,
começamos a compartilhar nossas impressões sobre a comunidade. Cada um a partir
de sua história de relações. Surgiram concordâncias, divergências, ideias,
desabafos, sorrisos. Um de nossos amigos sugeriu que hoje a comunidade anda
como a maioria das comunidades: numa infelicidade comum, com suas necessidades
básicas atendidas, como moradia, luz, água, saneamento, escola, creches, centro
de saúde. Existe pobreza, existe violência, existem dificuldades na educação,
na saúde, na infraestrutura. Mas onde não existem estas dificuldades?
Daí,
começamos a pensar juntos sobre o que as pessoas querem para além das
necessidades básicas. O que almejamos? O que sonhamos? De que modo o estigma
sobre a Comunidade Chico Mendes, tão reproduzido pela grande mídia, criam à
priores sobre nós mesmos, criam identidades cristalizadas que nos limitam e
excluem? À quem serve nosso lugar social de periferia? Que papéis a Casa Chico
Mendes desempenha hoje na comunidade? Muita coisa, né?
Em Maio... pensando
em tudo que tem surgido, nosso Sarau este mês procurou criar campo para
compartilharmos nossos sonhos. Os sonhos que nos levam a caminhar, criar e
recriar no mundo. Estivemos juntos, mediados pelo afeto, conversando sobre
assuntos oníricos, estes que nos movem no mundo. Daí, de repente, percebemos
que estávamos, em maioria, jovens. E começamos a nos dar conta de que a
juventude sempre movimentou a Casa Chico Mendes, desde seu início. Poderíamos
viajar nas diferentes concepções de juventude e o que isso diz da relação não
institucional da Casa com as pessoas da comunidade. É tão bonito, como esta Casa – as pessoas que
dela fazem parte – agregam conhecidos e desconhecidos, novos e velhos, cada um
com sua forma de ser e estar no mundo, amigos trabalhando em coletividade, sem
a pretensão de salvar o mundo, querendo a relação que afirma o outro, acolhe e potencializa!
Makhiély.
De forma sutil e
indelicada (por que não?), um dos integrantes da casa Chico Mendes, Yuri,
propôs ao grupo que o tema do sarau seria os sonhos de todos que ali estavam e
que se utilizassem daquele espaço para compartilhar uns com os outros. Sentados
em um tapete aconchegante, ao redor de garrafas de vinho como suporte para
velas, o clima era de acolhimento e calor, e nada como um vinho suave ou seco –
de acordo com o nível de doçura necessário a cada um – para deliciar mais ainda
a companhia de pessoas tão especiais.
Sonhos não
precisam ser descartados e considerados apenas como coisas inalcançáveis, como
geralmente costumamos ouvir, mas podem conduzir nossa caminhada, nos faz querer
mais. Galeno, autor uruguaio, fala exatamente isso, quando se questiona “para
que serve a utopia?” e responde que ela serve para que não se deixe de
caminhar.
Dentre os sonhos
que nos fazem caminhar se colocaram naquele espaço a importância também do que
já temos, do que já alcançamos, do que está próximo e que as vezes não nos
damos conta. Sonhos interligaram-se naquele espaço, constituindo uma teia, ou
melhor uma rede, que demonstra também o que nos faz estar
juntos. Foram idealizados naquele momento vontades muito peculiares e, que
mesmo parecendo contraditório falar, as peculiaridades fizeram eco,
demonstrando o momento em que a Casa Chico Mendes se encontra: Efervescer.
Vanuza.
Além de vinhos, velas e tudo o
necessário para criarmos o clima onírico, trouxemos outra forma de expressão.
Pedaços de papel pardo estavam colocados sobre duas grandes mesas na sala, e
havia tinta disponível para quem quisesse pintar, dessa possibilidades surgiram
desenhos complementados e jogos de advinhação, uma comunicação outra foi
estabelecida. Cada um deixou sua marca, fosse uma pincelada ou uma mancha de
vinho mesmo.
Além de falarmos sobre nossos sonhos,
objetivamos eles ali de alguma forma, ensaiamos desejos e fantasias e o que
acredito ser o mais bonito: compartilhamo-nos.
Projetamos alguns filmes com uma
proposta estética surreal para combinar com o tema e ir na onda do cinema que
estamos por agora.
Nossos sonhos nos afetam, sonhamos com
o afeto.
William.
E prosseguimos...
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